Compliance no Agronegócio
As empresas do agronegócio têm percebido cada vez mais a importância de um programa de Compliance, tendo em vista que o mercado está cada vez mais exigente em relação à conformidade e ética. Ademais, o Compliance traz os seguintes benefícios para o agro: prevenção à fraude e corrupção; mitigação de riscos ao patrimônio e reputação da empresa; implementação de procedimentos e controles internos rígidos que o agro deve seguir.
Assim como em outros setores, escândalos de corrupção no agronegócio já foram noticiados e após a investigação intitulada “Operação Carne Fraca”, da Polícia Federal, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) intensificou o trabalho de Compliance e lançou o Pacto pela Integridade e o Selo Agro Mais integridade.
Operação Carne Fraca
A Operação Carne Fraca foi deflagrada pela Polícia Federal em março de 2017 para investigar um esquema de fraude envolvendo fiscais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e frigoríficos de grande porte e outras irregularidades nas empresas.
A operação envolveu cerca de 30 empresas, dentre elas grandes nomes do setor alimentício e levantou irregularidades como: adulteração de certificados de qualidade das carnes comercializadas tanto no mercado interno quanto externo, o suposto uso de fraudes para ocultar o uso de carne vencida ou colocar produtos proibidos em linguiças; tentativa de mudar data de validade de embalagens, esquema de corrupção entre frigoríficos e fiscais para acelerar a liberação de produtos; o suposto oferecimento de suborno para evitar suspensão de uma unidade ou injeção de mais água do que permitido em frangos e substituição de carne de peru por soja em salsichas enviadas para merenda escolar.
Os envolvidos foram investigados por corrupção, passiva e ativa, concussão, peculato, prevaricação, advocacia administrativa, falsificação e adulteração de substância ou produtos alimentícios e lavagem de dinheiro. Executivos tiveram prisão temporária decretada, houve condução coercitiva e busca e apreensão nas unidades das empresas.
O escândalo teve uma repercussão muito grande e, como consequência, a perda da confiança nas empresas e produtos e prejuízos financeiros altíssimos. Uma das empresas apresentou um prejuízo de 1,1 bilhão de reais em 2017.
Além disso, na época, importadores, entre eles a União Europeia e a China, anunciaram restrições temporárias à entrada de carne brasileira em seus territórios e também anunciaram o aumento na fiscalização da carne originada do Brasil.
Recentemente, em dezembro de 2022, uma das grandes empresas envolvidas na Operação Carne Fraca, a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU) anunciaram a assinatura de um acordo de leniência, fruto das investigações em torno da Operação.
Em 2018, a empresa procurou a CGU e a AGU para negociação de acordo de leniência, para o qual passou a colaborar com as investigações para mitigação das sanções a serem aplicadas em decorrência dos ilícitos praticados.
Nesse acordo, a empresa se comprometeu a pagar R$583,977 milhões ao Tesouro e a aperfeiçoar o programa interno de conformidade. O valor do acordo inclui a devolução de vantagens indevidas e o pagamento de multas previstas na Lei Anticorrupção e na Lei de Improbidade Administrativa.
Programa de Integridade e Selo Agro + Integridade como resposta
Após toda a repercussão decorrente da Operação Carne Fraca, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento (MAPA) mergulhou mais fundo para dar continuidade ao trabalho exercido no combate à corrupção.
Em abril de 2017 a Portaria MAPA nº 705 instituiu o Programa de Integridade (compliance) no Ministério com o objetivo de implementar e aprimorar mecanismos de prevenção, detecção e remediação de fraudes, irregularidades e desvios de conduta.
Essa portaria instituiu também o Comitê de Integridade, responsável por elaborar, implementar, coordenar, operacionalizar e monitorar o Plano de Integridade, onde foram formalizadas as ações de integridade (e respectivos responsáveis), no âmbito interno e externo.
O Programa de Integridade (compliance) do MAPA busca, desde sua implantação, uma atuação voltada para uma nova cultura no âmbito interno ao Ministério (implementando práticas voltadas para o fortalecimento das Unidades Instrumentais de Integridade da Pasta, políticas internas, procedimentos e regras de compliance anticorrupção e com ações voltadas para a conformidade com as legislações, decretos e normativos de acordo com a política estatal ) e no âmbito externo com o fomento, o reconhecimento das boas práticas de produção pelos diversos setores do Agronegócio, sob a ótica da responsabilidade social e sustentabilidade, e ainda o esforço na mitigação das práticas de fraude, suborno e corrupção.
Este selo reconhece e premia as empresas e entidades do setor que adotarem práticas de integridade, ética, responsabilidade social e sustentabilidade e tem por objetivo:
- Estimular a implementação de programas de integridade, ética e de sustentabilidade, em seu amplo espectro, quais sejam: econômico, social e ambiental;
- Conscientizar Empresas e Cooperativas do Agronegócio sobre seu relevante papel no enfrentamento às práticas concorrenciais corruptas e antiéticas;
- Reconhecer as práticas de integridade e ética implementadas pelas Empresas e Cooperativas do Agronegócio no mercado nacional, fomentando a participação no prêmio “Empresa ProÉtica” da Controladoria Geral da União;
- Mitigar riscos de ocorrência de fraudes e corrupção nas relações entre o setor público e o setor privado ligado ao Agronegócio.
Procedimento para a obtenção do Selo Agro + Integridade
Em dezembro de 2022 o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento aprovou o regulamento para premiação do “Selo Mais Integridade” (Portaria MAPA nº 542/2022), relativo ao exercício de 2023/2024.
Os interessados em obter o “Selo Mais Integridade” deverão realizar sua inscrição diretamente no site oficial do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
A portaria traz o procedimento para obtenção do Selo Agro + Integridade (inscrição, requisitos e documentação de habilitação, análise dos documentos e avaliação).
O conjunto de documentação a ser apresentado é amplo e traz listas sob o enfoque anticorrupção, trabalhista e da sustentabilidade. Sob o enfoque anticorrupção, algumas das documentações exigidas são:
- Documento assinado por dirigente da alta administração que comprove a implementação e apoio ao programa de compliance pelo corpo diretivo da empresa ou cooperativa;
- Código de ética ou de conduta aprovado, com comprovação de ampla divulgação do público interno e externo;
- Canal de denúncias efetivo, implementado há mais de doze meses da data final do prazo de inscrição;
- Comprovação da realização de treinamento nos temas relacionados ao programa de compliance, dentre outras.
Secretaria-Executiva do Comitê Gestor do Selo Mais Integridade
Os documentos apresentados pelos interessados serão analisados pela equipe da Secretaria-Executiva do Comitê Gestor do Selo Mais Integridade (SECG) que elaborará relatório técnico conclusivo denominado Relatório de Análise Final (RAF), com a avaliação do cumprimento ou não dos principais requisitos constantes da documentação apresentada pelas empresas e cooperativas inscritas.
As empresas e cooperativas consideradas aptas à premiação do Selo Mais Integridade, após publicação de ato pelo Secretário-Executivo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, com o resultado, serão convocadas pela Secretaria-Executiva do Comitê Gestor do Selo Mais Integridade para a cerimônia de premiação, devendo assinar o Pacto pela Integridade, Responsabilidade Social e Sustentabilidade Ambiental e Uso Adequado da Marca.
As premiadas poderão utilizar a marca “Selo Mais Integridade” de acordo com o disposto no regulamento.
O direito de uso da marca “Selo Mais Integridade” será automaticamente suspenso, a partir da comunicação formal da secretaria-executiva do Comitê Gestor à pessoa jurídica premiada que durante o exercício de seu direito de uso do Selo, caso incorra em certas situações ou sobrevenham irregularidades determinadas. Será assegurado à pessoa jurídica o exercício do contraditório e ampla defesa.
Guia de boas práticas anticorrupção da agroindústria
Com o intuito de promover entre diferentes stakeholders do setor da agroindústria, a adoção de compromissos de integridade com foco na interação com o setor público local e com as cadeias de suprimento e logística, dezesseis empresas do setor se uniram à Rede Brasil do Pacto Global para desenvolver uma ação coletiva setorial da agroindústria.
As regras e os princípios de conduta contidos no Guia foram elaborados com base nas melhores práticas de mercado no combate à corrupção, mas também com uma visão muito clara de como devem ser utilizados pelos setores da agroindústria.
O Guia busca não apenas contextualizar os temas e sintetizar o que os membros da Ação Coletiva preconizam, mas também exemplificar boas práticas que devem permear o ambiente de negócios, mais precisamente, o agronegócio.
O Guia agrega valor tanto para grandes empresas quanto para as pequenas e médias.
Conclusão
Os benefícios e oportunidades que um programa de integridade traz para os negócios, para o consumidor e para a sociedade são perceptíveis.
Além da otimização de processos, o Compliance traz no seu bojo a mitigação de riscos, a redução com problemas regulatórios, a conformidade com a legislação, o relacionamento com terceiros idôneos, a implantação de uma cultura ética, protegendo o setor de prejuízos reputacionais e financeiros decorrentes de fraudes, subornos e corrupção.